terça-feira, 21 de abril de 2009

Medo

Imagine-se numa noite quente. Todas as pessoas na sua casa já foram dormir, o escuro total o envolve, exceto pela luz do monitor do computador que você insiste em usar, graças a diálogos no messenger. Eis que um amigo seu lhe pede, exatamente no momento em que você decide ir dormir, para ver um vídeo. Você não hesita, e clica no link, para então ver uma coisa que lhe parece estranhamente familiar, mesmo que tenha certeza de nunca ter visto: Obedece a la morsa. Você se assusta a princípio, mas insiste em ver, insistindo na sua coragem. Aos poucos, você não tem mais medo da criatura deformada em roupas exóticas que insiste em dançar mesmo com suas limitações físicas, você chega a sentir pena, compaixão. O plano muda, e, mais tarde do que deveria, você percebe que ela se aproxima em passos cambaleantes da câmera, seu coração se alarma, uma corrente de adrenalina passando por seu corpo, você vê aquilo se aproximando, você insiste em ver, diz a si mesmo que é só um ser humano, você olha pro rosto daquela pessoa, e vê um olhar quase maligno, você olha para seus braços e pernas deformados, acompanha o cambalear, a câmera se aproxima do ser ao mesmo tempo em que ele se aproxima dela, a música que perdurara o vídeo inteiro cessa, e só o que você ouve é o som dos passos, você entra em desespero, aquela criatura não está se aproximando da câmera, está se aproximando de você! Sua parte racional insiste que não é verdade, mas você não consegue deixar de sentir isso, e você, assustado, fecha a janela, mesmo que faltem apenas 15 segundos para que o vídeo termine.

O medo, tal como a dor, é impossível de controlar, ele não depende de você, depende do exterior, e você não pode fazer com que o exterior mude, ele quer que você tenha medo, você vai ter medo, não há escolha.
O medo, tal como a surpresa, pode ter várias formas, mas que se resumem todas a uma mesma sensação. E como a surpresa, o medo se dá pura e simplesmente com uma quebra da rotina, um hábito quebrado, algo que está fora do lugar.

Esse medo, que pode ir desde o inocente terror que os cães têm em relação a um simples e benéfico banho, ao medo da morte. Talvez não a sua própria, quem sabe não é a de um amado? E tal como a dor, o medo revela o verdadeiro ser humano, apenas frente ao horror um pode demonstrar suas verdadeiras virtudes. Frente ao medo verdadeiro, todas as máscaras caem, ele é a verdadeira representação da natureza humana.

Há aqueles que podem controlá-lo, e, se o medo é a representação do homem, então aquele que o controla também pode controlar a humanidade. Quem ousará desafiar alguém que o aterroriza? Quem poderá contrariar alguém que lhe causa uma sensação desagradável de impotência, que lhe faz sentir que, se não obedecê-lo, ele poderá lhe fazer mal ou àqueles que lhe são queridos?

Os corajosos.

O medo, diferente da surpresa, não é caracterizado por apenas um momento, onde você leva um susto, e também é diferente da dor, indestrutível, destruidora, mortal.

O medo é uma proteção, uma maneira de preservar a si e aos outros, uma maneira de fazer com que aquilo que você preza seja mantido. Mas, se para proteger aquilo que você preza, o medo precisa ser derrotado, se para que você e aqueles que lhe são queridos possam ser felizes, para que estejam bem, o escuro precisa ser enfrentado, o governante amedrontador precisa ser contrariado, e aquele monstro que você chama orgulho precisa ser derrotado, para que a crueldade e o sangue frio deixem de existir, você precisa sacrificar a si próprio de alguma maneira, então o medo toma outra forma, a que chamamos coragem. Ah, mas não se iluda, ela ainda é o medo, mas agora ele se transformou, e tal como uma uma treva que se torna luz, ele muda sua natureza, mas nunca perde sua verdadeira essência. E então você vê que aqueles que usam o medo são os mais fracos dos homens. Aqueles que vêem nele uma maneira de controlar ao próximo só o fazem por não verem em si próprios uma maneira de fazê-lo de outra forma. Essas pessoas sucumbiram ao medo, e não podem transformá-lo em coragem. E se tornam covardes. Covardes, não por terem medo, mas por serem incapazes de ver através dele, e o medo os domina, e o medo os destrói.

Há também aqueles que usam o medo por prazer, que vêem no horror alheio sua fonte de felicidade. Muitos os chamam de loucos, eu os admiro, e os chamo fascinantes.
Tenho medo do medo, e vejo em sua derrota um grande prazer. E derrotá-lo é, muito, muito simples. Não é necessário nada mais do que ententendê-lo. E quando o fizer, ele já terá tornado-se um calor que lhe dará força, que quebrará barreiras, que fará com que o nada exista, e o impossível se desmantele.


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